04 Jun NOTA DE IMPRENSA | 04.06.2025
Foi com surpresa que o STI assistiu à telenovela criada na TVI e CNN sobre um processo judicial que tem mais de um ano. Nunca assistimos a noticias onde a AT e os seus inspectores recuperam, anualmente, milhares de milhões de euros para os cofres do Estado, travam a entrada no país de toneladas de estupefacientes, fármacos falsos, armas, mercadorias perigosas e ilegais, tráfico de seres humanos e de espécies raras, entre muitos outros. Mas numa presumível situação em que a organização falhou, tivemos uma telenovela, com um ano de atraso. Numa autoridade com mais de 10000 trabalhadores, em que eventualmente meia dúzia poderá ter falhado, seria bom dar-se também relevo ao que se faz bem tentando perceber o que correu mal e como se pode melhorar. É por isso que hoje enviamos esta nota às redacções. O papel da comunicação social é central na criação de uma sociedade mais justa. E não há nenhuma sociedade justa sem a existência de justiça fiscal.
A inexistência de quadros oficiais de funcionários nas Alfândegas. A falta de vagas para transferência e inexistência de movimentos de transferências que cria uma imobilidade que pode propiciar esquemas corruptivos. Alfândegas que não abrem vagas apesar de haver saídas para aposentação todos os anos. A entrada de pessoas sem a devida qualificação profissional. Opacidade na gestão de recursos humanos. Dirigentes que passam décadas no mesmo lugar. Estes, são só alguns dos temas que deveriam despertar a curiosidade de todos.
Algumas questões: Quantos lugares estão ocupados nos quadros? Quantas vagas estão livres? Quando abre o movimento de transferências? A quem interessa a opacidade vigente?
Como querem combater a corrupção mantendo este tipo de arbitrariedades? As nomeações na AT passaram a ser totalmente previsíveis. Qualquer um sabe quem vai ser o próximo nomeado porque não existem concursos verdadeiramente transparentes. Primeiro nomeia-se em substituição, depois deixa-se a pessoa a ganhar experiência no cargo, de seguida abre-se um concurso e diz-se que quem lá está é o melhor porque já tem muita experiência. Outra solução é ficar lá eternamente em substituição. O sindicado já denunciou este processo há anos. O que fez o poder político?
Quem assume responsabilidades?
Segundo o Balanço social da AT em 2023, a organização tinha 256 dirigentes e 1850 chefes. Por certo, numa das múltiplas reuniões que realizam entre todos já alguém relatou as condições miseráveis em que trabalham os colegas nos portos e aeroportos. Já alguém, certamente, referiu que ao contrário dos países com quem nos gostamos de comparar, por cá, não temos equipamento, não temos segurança, não temos fardas decentes, não temos autoridade e nem um simples e miserável cartão de identificação de inspector da AT com o devido crachá temos actualizado. Por certo, nessas reuniões das elites da AT, já alguém sugeriu que se constituam equipas de 4 ou 5 elementos, que de forma rotativa, assumam as funções mais sensíveis de controlo da fronteira externa da União Europeia. Naturalmente, sugeriram também que se dê a devida formação a essas equipas para estarem sempre preparadas para assumir esses postos de “combate” na defesa de Portugal e da UE. No caso específico do scanner, talvez até já haja quem tenha sugerido criar uma sala de visualização das imagens, para que, longe do terreno, estejam mais um ou dois colegas a visualizar e a controlar a mesma imagem que o colega que está no terreno.
Quem tem obrigação de ajudar a que os processos corram bem no terreno, quem tem obrigação de pensar nos problemas e encontrar as soluções, devia fazê-lo. O sindicato tem-no feito, sempre de forma positiva, propositiva, proactiva e solidária, para ajudar, simplesmente não nos deixam. Porquê?
Se a AT em vez de gastar milhões de euros a criar um sistema para que os inspectores justifiquem os acessos à base de dados, naturalmente devido ao trabalho que têm de fazer, tivesse investido esses milhões a adoptar a metodologia operacional que aqui referimos, provavelmente não estaríamos hoje a escrever esta nota de imprensa.
A quem interessa o não rejuvenescimento dos Recursos Humanos da AT? A quem interessa a diminuição da qualidade dos funcionários e as entradas de técnicos sem preparação nem formação? A quem interessa que no máximo 10% da casa faça inspecção e mesmo estes, de forma precária e sem qualquer incentivo à proactividade, iniciativa, trabalho de equipa, curiosidade? E sim, a curiosidade é fundamental em carreiras inspectivas e de investigação, ao contrário do que que a administração e o poder político têm imposto desde a triste história da Lista VIP.
Quem são os responsáveis internos pela situação a que chegámos? O que fizeram os Governos anteriores para resolver estes e outros problemas? Está o actual Governo pronto para encontrar soluções em conjunto com os inspectores da AT?
Quantas vezes dissemos nós, STI, que os mecanismos que foram sendo criados foram para dificultar o combate à fraude e evasão fiscal e não para a incentivar e tornar mais eficaz?
A inspecção da AT tem vindo a ser completamente destruída. A Troika foi enganada por Portugal pois a única exigência que fez ao nível de reforço da administração pública foi precisamente para a Inspecção Tributária e Aduaneira e o que Portugal fez foi fingir que estava a reforçar a AT, dar formação às pessoas, e depois colocá-las a atender telefones e a trabalhar para o sector privado, apoiando advogados, solicitadores e contabilistas certificados a fazerem o seu trabalho e, legitimamente, a cobrarem honorários aos seus clientes. A vertente inspectiva e de investigação da AT foi sendo totalmente absorvida pelas funções de apoio às famílias e às empresas. E porquê? Porque foi essa a opção de gestão tomada.
Mal. E o sindicato desde sempre que alertou para esse facto. É preciso bom senso, equilíbrio, visão estratégica.
Sempre tendo em consideração o princípio da presunção de inocência, até porque vídeos em telemóveis há para todos os gostos, desde logo com deepfakes que apenas especialistas técnicos conseguem desmontar, a ser verdade, esta situação preocupa e entristece o STI. Sobretudo porque temos avisado, há muito tempo, para a total degradação da AT enquanto organização central para a existência do Estado. A AT transformou-se numa desorganização e a principal responsabilidade é da classe política.
O STI está, como sempre esteve, pronto para ajudar a transformar a AT numa organização do século XXI, assim o actual Governo nos dê essa oportunidade.
A Direção Nacional