07 Nov EXPRESSO | “O combate à fraude fiscal está comprometido, a Autoridade Tributária está a matar a investigação”
Presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI) desde janeiro, Gonçalo Rodrigues, diz que o Fisco passou a ser uma máquina burocrática de balcões de atendimento ao público. O combate à evasão e fraude fiscal, à criminalidade económico-financeira e a corrupção são “parentes pobres”. As críticas vão para a cúpula da Autoridade Tributária, que gere mal a organização, e para o poder político, que nada faz para melhorar a máquina fiscal – e não se preocupa em colocar enfoque no combate à fraude
Com uma estrutura mais magra e crescentemente envelhecida, com uma gestão burocrática e tutelada por políticos sem coragem de reorganizar a casa, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) transformou-se numa máquina de atendimento ao público, sem foco no combate à corrupção, à criminalidade económica e à fraude e evasão fiscal. Em conversa com o Expresso na semana em que, juntamente com mais cinco sindicatos da área da justiça, organiza uma conferência para debater as “Funções Soberanas do Estado: Transparência e Combate à Corrupção”, Gonçalo Rodrigues, desde janeiro à frente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI), diz mesmo que “a AT está a matar a investigação” e a facilitar a vida aos evasores fiscais e criminosos – “transformaram-nos em robots. Para quem está do outro lado e percebe como a máquina funciona, é muito mais fácil enganar uma máquina robótica”.
Acha que a diretora-geral da AT, Helena Borges, já devia ter saído, diz-se até “pessoalmente” desiludido com o Ministro das Finanças, ex-colega da casa e companheiro de partido, e avisa que, se tudo ficar como está, haverá greves na certa.
Há muita corrupção no Estado?
Há corrupção na sociedade portuguesa, de um modo geral, e julgo que poderia fazer-se mais sobre essa matéria, nomeadamente na AT. Há um grande conflito entre a privacidade e o combate à corrupção e à criminalidade económico-financeira. As regras de acesso às bases de dados são tão restritivas que prejudicam o combate à corrupção. É preciso encontrar um ponto de equilibro.
Um inspetor tributário quando deteta suspeitas de corrupção, o que faz?
Quando está a trabalhar numa ordem de serviço, trabalha como sempre: é comunicado superiormente e ao Ministério Público. A questão é o que acontece quando alguém encontra uma suspeita lateral ao trabalho que está a fazer. Neste momento, não lhe vão mexer.
Porque não?
Se o fizerem, correm o risco de serem acusados de acesso indevido às bases de dados. Desde a lista VIP que o nosso trabalho está muito dificultado. Concordo que é preciso ter regras, mas enquanto inspetor tenho de ter a oportunidade de dissipar dúvidas fiscais ou em processo-crime. Veja este exemplo simples: um colega está no balcão de um serviço de finanças e todas as semanas lá vai um solicitador ou advogado fazer números de contribuintes de não residentes. Nós sabemos que eles cobram €200/€300 ou mais por cliente. Quem o atende começa a fazer contas e chega a valores astronómicas [de honorários]. O funcionário devia ser incentivado pela organização a dar uma vista de olhos e a ver se ele liquidou o IVA – pelo menos.
Não sendo incentivado, é impedido?
É impedido. O advogado, que sabe como as coisas funcionam, diz que suspeita que houve violação da sua informação pessoal, a máquina vai ver quem entrou na base de dados e pergunta, funcionário a funcionário, pela ordem superior. A AT não considera a minha suspeita como uma justificação funcional. Ora, isto é matar a investigação. Antes estávamos a trabalhar numa ordem de serviço mas, se suspeitássemos de alguma coisa ao lado, investigávamos. Hoje em dia, para que havemos arriscar um processo disciplinar se a própria casa não quer que se trabalhe assim? É preciso haver regras, as pessoas têm direito à privacidade, mas isso não nos pode impedir de trabalhar. Quem é que na Segurança Social impede acessos aos nossos IRS? Julgo que lá não há esse pudor todo que há na AT. Foi feito um garrote à AT, em parte por razões entendíveis, mas passou-se do 8 ao 80.
Poderiam fazer muito melhor trabalho no combate à corrupção?
Sem dúvida. Não há corrupção sem haver dinheiro fora do circuito – não vou pagar a quem vou corromper com o dinheiro que foi faturado direitinho. Quem é a entidade mais bem preparada para analisar a contabilidade em Portugal? A AT, que devia ser sempre os primeiros olhos do MP no combate à corrupção e não o é porque a organização não está talhada para tal. A AT direcionou-se muito para uma função importante, que é o apoio às famílias e empresas, porque é a maior pressão que tem, e a parte da investigação e do combate à fraude e evasão fiscal, se não se fizer, quem se vai queixar? Se os governantes não dão valor, é o parente pobre. Neste momento, o combate à corrupção, à criminalidade económica e à FEF são o parente pobre da AT. Temos uma AT de atendimento ao público.
Para quem é mais confortável ter uma AT sem levantar grandes ondas: à direção ou aos comandos políticos?
Aos dois. Considero que o problema começou a partir do Governo de José Sócrates. Os funcionários da AT foram os únicos que perderam o vínculo de nomeação ao Estado. Isso fragiliza logo o inspetor. Depois houve o problema da Lista Vip. Ainda houve algumas tentativas de Fernando Rocha Andrade de tentar compor a questão, dizendo que os funcionários não se deviam privar de aceder à base de dados, mas aquilo não resultou. Temos uma advogada que trabalha a tempo inteiro em processos disciplinares por causa do acesso à base de dados. A mensagem espalha-se: “Porque hei de arriscar ter de ir a lisboa, ser ouvido?”. Os políticos não têm incentivado que este trabalho seja feito, nem ajudam a uma reorganização da casa. Falta coragem.
E tem havido muitas suspeitas de corrupção de funcionários da AT?
Temos 7.000 sócios no ativo, se isso acontecesse, garantidamente os nossos advogados seriam chamados a ajudar os sócios. Não temos nenhum processo, nem tem havido notícia de casos. São residuais.
Não pode ser por falha de auditorias internas, tal como falham as externas?
Não iria por aí. Os processos estão informatizados, os prazos também… não vejo como. A única vertente em que eventualmente alguém poderia fazer correções abaixo do devido seria na inspeção quando se vai a uma empresa. Encontrar 1 milhão e corrigir menos. Mas o processo de inspeção é feito pelo técnico, é visto pelo chefe de equipa, vai para o chefe de divisão e às vezes passa pelos diretores de finanças. Ficaria muitíssimo surpreendido se houvesse esse tipo de esquemas.
Se há tanta corrupção, onde estão os corrompidos? É só a classe política?
Essa corrupção normalmente acontece quando há negócios envolvidos. Nós não os fazemos: construção civil, compras maciças, etc.
Chegou a dizer que a AT bateu no fundo. Além da corrupção, o combate à fraude e evasão fiscal também estão comprometidos?
Tenho a certeza de que estão comprometidos.
A informatização, o e-fatura, não resolveram parte das tarefas?
Resolveram algumas, mas continua a haver muitas divergências. Há muita coisa que passa. Basta ver a situação dos contratos de arrendamento.
A Inspeção Geral de Finanças diz que podiam controlá-las fazendo um cruzamento muito simples de informação. Porque não fazem?
Porque não há recursos humanos. Nada é só informático. Primeiro é preciso ter uma ideia: a máquina não tem a ideia sozinha. Depois alguém tem de agarrar nas bases de dados e fazer o trabalho.
É uma ideia tão simples. Se não há ideias destas, faz-nos temer o pior.
É preciso que alguém tenha ideias, e não há quem as tenha. Porque o funcionário não está formatado, porque não é incentivado. Eu tenho180 ou 200 pontos para fazer, se não os fizer não atinjo os meus objetivos de SIADAP. Eu quero é cumprir os pontos. Enquanto dantes eramos incentivados a esse trabalho – eu tive um chefe de divisão que me incentivava a pensar neste tipo de coisas, agora não. Há ainda um terceiro problema: a centralização da AT. A AT quer ter um controlo absoluto do que se passa, a partir de Lisboa. Isso mata a criatividade, são precisos olhos no terreno. Com medo da privacidade, da lei do cibercrime mas também por causa da orientação da hierarquia da AT. Há que conseguir um ponto de equilíbrio e não tem havido lideres, nem governantes, que os tentem encontrar. Outra administração poderia responder a isto com facilidade. A lei diz que desde que haja justificação funcional os acessos são devidos. Se a AT confiasse nos seus trabalhadores, se eu justificasse um acesso dizendo que suspeitei de uma fatura porque reparei que era a fatura nº 10 e já estamos em novembro, ou que estou a fazer uma execução fiscal, e há um grande devedor que parou um grande Ferrari à porta…este tipo de justificações deviam ser válidas e não são.
No imobiliário fala-se em muitos pagamentos por baixo da mesa. O que se faz nestas áreas?
Voltamos à questão dos recursos humanos. Quando eu entrei para a inspeção eramos 30 no meu serviço, agora somos 6. Isto é valido para o país todo: a fazer inspeção estarão 900 pessoas. E voltamos à centralização da AT, que prejudica este combate. Quem está no terreno é que tem a perceção do que deve escavar. Antes os diretores de finanças tinham mais autonomia. Se considerássemos que era melhor apostar na construção civil, apostaríamos. Hoje em dia não é assim.
A descentralização não arrisca a ter equipas justiceiras ou permeáveis ao poder local?
O que é melhor? Ter só uma pessoa com todo esse poder ou várias? Antes as coisas funcionavam melhor e não é por ser saudosista. O relatório de combate à fraude e evasão fiscal prova-o: só pela inflação os valores de correção tinham de ter subido. As pessoas fazem o que são incentivados a fazer. É impossível haver uma boa investigação sem haver alguma liberdade de trabalho. Transformaram-nos em robots. Para quem está do outro lado e percebe como a máquina funciona, é muito mais fácil enganar uma máquina robótica.
“Sentimo-nos desprezados pelo ministro das Finanças”: greve dos trabalhadores dos impostos por tempo indeterminado no horizonte
Presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI) desde janeiro, Gonçalo Rodrigues reuniu-se três vezes com duas secretárias de Estado das Finanças, e considera que, além de terem dado o dito pelo não dito, não conhecem a máquina fiscal nem as suas carreiras. O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, que devia ter estado presente, nunca se dignou a recebê-los: “Nem que fosse só conversar, por meia hora”
Os trabalhadores dos impostos tiveram “três reuniões com o Governo completamente inúteis”. “Foram duas reuniões a dizer uma coisa e uma terceira a dizer o seu contrário”. No fim, “disseram-nos que nós não éramos uma prioridade para o Governo”.
Em conversa com o Expresso na semana em que, juntamente com mais cinco sindicatos da área da justiça, organiza uma conferência para debater as “Funções soberanas do Estado: transparência e combate à corrupção”, Gonçalo Rodrigues, desde janeiro à frente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI), diz-se desiludido com o ministro das Finanças, com quem entrou na Autoridade Tributária, há quase 25 anos, e com quem partilha a filiação partidária. Face ao descontentamento, o aumento da escalada de tensão é certa.
Fala na necessidade de reorganizar a casa. A diretora-geral [Helena Borges] devia ser substituída?
Em 2023, ainda com a direção anterior, foi decidido por unanimidade pedir a demissão da diretora-geral por razões relacionadas com a gestão de recursos humanos. Consideramos que os recursos humanos têm sido muito mal geridos: retiram-se recursos de combate à fraude para manter serviços abertos, há concursos muito atrasados, a avaliação permanente parou desnecessariamente, há os colegas do artigo 38º [ técnicos de administração tributária adjuntos, TATA] que se sentem injustiçados, e com razão.
A minha pergunta é mais abrangente e vai às questões operacionais. Diz haver falta de estratégia e planeamento: também é motivo para substituição?
Essa é a minha opinião, mas pessoal. A diretora-geral teve oportunidade, com o anterior Governo, de ter feito diferente, até porque tivemos um secretário de Estado que tinha sido subdiretor.
Porque acha que Helena Borges sobrevive apesar das críticas e das polémicas?
Falta um ano, pouco mais, para acabar a comissão de serviço. O Governo sabe como a casa está: média etária de 57 anos, os bons a sair, o sindicato está em luta, vai haver mais instabilidade social na casa, que acabará por chamuscar a imagem do diretor-geral, seja ele qual for. E o Governo, em vez de estar a queimar outra pessoa agora, prefere deixar a diretora-geral até ao fim, escusando-se a desgastar a pessoa que tem em vista.
Vai haver greves?
Vai, de certeza absoluta. Dia 15 de outubro já fizemos a maior reunião de trabalhadores da história da AT, com mais de 4000 trabalhadores. É verdade que foi por meios telemáticos, mas os meios já existiam há muitos anos, e os serviços pararam. Isto devia ser um sinal para o Governo. O Governo julga que as pessoas estão muito acomodadas, mas não estão. Temos greve marcada para 19 e 20 de dezembro, com manifestação. E, se até ao final do ano nada se passar, vamos avançar com greve por tempo indeterminado.
Nada se passar é o quê? O que é prioritário para suspenderem a greve?
Temos um caderno reivindicativo extenso, mas prioritário para nós é resolver o problema dos colegas que estão abrangidos pelo artigo 38º, os TATA – técnicos de administração tributária adjuntos, cuja carreira foi extinta no final de 2019, e que têm de transitar para uma nova carreira. As regras foram de tal modo mal desenhadas que os colegas, transitando para a carreira nova, vão ganhar menos do que se ficassem na carreira antiga. A única maneira de resolver esta injustiça é que a tabela seja atualizada. O descontentamento nessa matéria é geral. A questão da avaliação também é importante, temos um caderno reivindicativo, mas estamos disponíveis para negociar, se o Governo estiver disponível. Prioritária é esta questão do artigo 38º.
E o Governo não está disponível?
Não, tivemos três reuniões com o Governo completamente inúteis.
Quem no Governo?
Esse é outro problema. O ministro não esteve nas reuniões. Estiveram a secretária de Estado da Administração Pública [Marisa Garrido] e a secretária de Estado dos Assuntos Fiscais [Cláudia Reis Duarte]. Na primeira apresentámos as nossas questões; na segunda as senhoras secretárias de Estado disseram que, sim, senhor, o Governo estava disponível para negociar e que iam fazer um protocolo negocial, incluindo a tabela salarial. Era para ser apresentado a 12 de julho, mas a 24 horas da reunião anularam. Depois convocaram-nos para setembro e, julgando nós que íamos receber o tal protocolo, disseram-nos que, afinal, não tinham autorização do Governo para avançar. Foram duas reuniões a dizer uma coisa e uma terceira a dizer o seu contrário. Isto gerou um grande descontentamento entre os trabalhadores.
Houve um recuo das secretárias de Estado?
Claramente. Se lhes perguntarem, se calhar, vão dizer que não, mas as notas nos caderninhos de quem lá esteve são iguais. Toda a gente ouviu o mesmo.
Porque houve esse eventual recuo?
Das duas uma: ou as senhoras secretárias de Estado se enganaram, o que não acredito, ou houve uma mudança de posição por parte do ministro. E elas tiveram de fazer o que lhes disseram para fazer. Disseram-nos que nós não éramos uma prioridade para o Governo.
Valorizam muito o facto de o ministro nunca vos ter recebido?
Claro. Quem é que está no Conselho de Ministros? As secretárias de Estado não percebem o que se passa na casa. Enquanto o ministro da Educação se reúne com os sindicatos e chega ao Conselho de Ministros e está envolvido na questão, aqui não. Estou convencido de que as nossas questões nem chegam ao Conselho de Ministros.
O ministro foi funcionário da casa.
Isso ainda é mais grave. Tem mais do que obrigação de conhecer os nossos problemas. Tem sido uma grande desilusão para mim nem sequer ter tempo para conversar connosco. Nem que fosse só conversar, por meia hora.
Sentem-se desprezados?
Sem dúvida. Até pessoalmente, no meu caso.
“Não responsabilizo a diretora-geral pela polémica das barragens” da EDP, afirma presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos
Presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI) desde janeiro, Gonçalo Rodrigues diz não saber se é comum um diretor-geral da casa reunir-se diretamente com contribuintes, como aconteceu com a EDP. Mas, sendo comum, devia haver atas do encontro
O caso das barragens da EDP, nas suas múltiplas dimensões – anulações de faturas de IMI e vendas à Movhera sem cobrança de IRC e Imposto do Selo – tem vindo a causar danos reputacionais à Autoridade Tributária, reconhece o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI). Embora estranhe que a diretora-geral se tenha reunido com a EDP em 2016 sem, aparentemente, deixar notas oficiais do encontro, diz não conseguir imputar-lhe as responsabilidades neste longo e tumultuoso processo. Primeiro, porque é normal que haja divergências de interpretação da lei fiscal, e depois porque, caso haja braços de ferro como o que ocorreu, teria cabido ao Governo tirar as devidas ilações – coisa que não fez.
Em conversa com o Expresso na semana em que, juntamente com mais cinco sindicatos da área da justiça, organiza uma conferência para debater as “Funções soberanas do Estado: transparência e combate à corrupção”, Gonçalo Rodrigues lamenta ainda o défice de comunicação de Helena Borges. “O que faz o diretor-geral da Polícia Judiciária (PJ) quando há operações importantes? Dá logo a cara, vem à televisão dizer o que foi feito. O que faz o inspetor da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE)? Vai para o terreno, para a fronteira, mostra o trabalho”.
A AT tem estado na berlinda por causa da polémica das barragens. Traz danos reputacionais à instituição?
A lei fiscal não é linear e dá azo a muita discussão, mesmo nos serviços há muito debate. Os artigos podem ser lidos de forma diferente. Do meu ponto de vista, a lei prevê expressamente que os equipamentos entram na determinação do valor dos prédios. Só o “cimento e alvenaria” não cumprem sequer o conceito de prédio, porque essas construções não são suscetíveis de produzir rendimento. O que produz a energia é o conjunto do betão, da alvenaria, do armazenamento e das condutas de água, e dos equipamentos.
Sendo normal haver divergências de interpretação, é normal uma diretora-geral demorar meses a acatar instruções de um secretário de Estado?
Aí a responsabilidade é de quem? Se não cumprissem uma ordem minha, eu teria de tirar daí as minhas ilações.
Que são?
Se há um diretor-geral que não cumpre as minhas ordens, tenho que substituí-lo. Não consigo responsabilizar a DG por essa polémica.
E é normal haver reuniões entre contribuintes e a AT, na presença da diretora-geral?
Não sabia, foi uma surpresa para mim. Se é normal, nunca foi do meu conhecimento.
E é normal não haver atas dessas reuniões?
Se as reuniões são normais, então, teoricamente, devia haver um protocolo e ele devia ser cumprido. Se foi uma coisa que nunca tinha acontecido, e calhou haver uma reunião com uma empresa, admito que tenha havido uma falha. Não tenho dados para avaliar.
Volto à pergunta inicial, se está a trazer danos reputacionais à AT.
Danos, traz. A AT tem tido esse problema. Nem capitalizamos o que fazemos de bom – processos importantíssimos que temos tido, por exemplo de apreensões de droga, nunca é a AT que aparece como o herói da ação – e quando é para dizer mal estamos na linha da frente. Aí, a diretora-geral também falha. O que faz o diretor-geral da Polícia Judiciária (PJ) quando há operações importantes? Dá logo a cara, vem à televisão dizer o que foi feito. O que faz o inspetor da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE)? Vai para o terreno, para a fronteira, mostra o trabalho. A nossa diretora-geral nunca teve esse perfil. Dizia-se que o Procurador Geral da República precisava de ter uma capacidade comunicacional maior: se calhar, na AT, temos esse problema também.
É perfil ou mais estratégia, achando que, não aparecendo, se expõe a menos riscos?
Não consigo responder. Sei que a diretora-geral não é uma pessoa de se esconder. Quando há eventos internos, ela aparece, não se esconde dos pares. Externamente, julgo que ela acha que quanto menos se falar da AT, melhor. Não digo que seja para se proteger, mas para os trabalhadores não é bom, porque não os valoriza aos olhos da sociedade e da classe política.